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Donos de metalúrgica paulista fecham as portas e não pagam direitos aos trabalhadores
No dia 20 de fevereiro, a metalúrgica Krause, em Santo André, entrou em recesso no feriado de carnaval e, para a surpresa dos seus 74 funcionários, decidiu não mais voltar. Esta tinha mais de 60 anos de atuação no mercado nacional e internacional, com a produção de chapelonas de flandre, moldes de letras do alfabeto para pintura, mas seus donos (Alex Krause e seus filhos Alena e Walter) aplicaram golpe depois do carnaval.
“Descansamos no carnaval e na quinta voltamos a todo vapor”, repete Eliana Stefan, as palavras de Walter Krause em uma reunião com os 74 funcionários, na sexta-feira anterior ao feriado. Na ocasião, Eliana, auxiliar de compras há quatro anos na metalúrgica Krause, lembra da surpresa dos funcionários quando Walter cedeu a quarta-feira de Cinzas como folga, em troca de um dia de férias. “Tem gente que trabalha lá há quase 30 anos e nunca teve emenda na quarta”. As pessoas questionaram a oferta, mas diante dos argumentos do patrão, os funcionários concordaram. “Vamos comprar mais máquinas para aumentar a produção”, disse Walter.
Kelly Pavani, vendedora há três anos, explica que “a fábrica inteira foi pedir o adiantamento, e Walter disse não ter dinheiro”. Entretanto, por informações do RH, a funcionária sabia que o saldo da Krause era suficiente para arcar com esses gastos, e ainda quitar o salário de fevereiro e as cestas básicas atrasadas. “Na reunião, chegamos a perguntar sobre o fechamento da fábrica e o Walter descartou a possibilidade”, lembra Kelly. Ela diz estar surpresa com o episódio, e confessa que, por estar grávida, precisa do dinheiro.
Segundo os funcionários, a metalúrgica estava em crise desde 2008, porém nunca foi informada a possibilidade de encerramento das atividades. Pedro Francisco, há nove anos como auxiliar de expedição na Krause, conta que ao chegar na quinta-feira, os funcionários estavam do lado de fora. “Havia carros de polícia, o pessoal do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, todo mundo sem entender o ocorrido”. Ele lembra com tristeza do ocorrido. “Fiquei decepcionado com essa atitude infantil”, lamenta. Para ele, o pior foi a vontade que os funcionários tinham em ajudar a empresa: compreendiam os atrasos do pagamento, falta de recursos e exerciam múltiplas atividades. “Eu trabalhava na expedição, na portaria e no almoxarifado”.
O maquinário
Além do fechamento, a família Krause retirou parte do maquinário da fábrica, o que motivou uma vigília dos funcionários por receio do retorno dos patrões para levar o restante das máquinas – o que, realmente, quase aconteceu. Leonardo Pinto, coordenador de produção há três anos, descreve a estratégia de Alex Krause para conseguir voltar ao local em segurança: “Alex ligava para o 190 e anunciava uma invasão à fábrica, quando o carro da viatura chegava, ele vinha atrás, entrava e saía com alguns papéis nas mãos”.
Segundo Leonardo, as máquinas foram enviadas para a fazenda da família, em Campo Limpo. “Os guardas disseram que no carnaval dois caminhões levaram o maquinário necessário para produzir as chapelonas”, isso o faz acreditar da possível abertura de uma nova empresa pelos Krauses. O coordenador pensa que tudo já estava armado, pois há tempos Alex pressionava a produção a aumentar o ritmo. “Acho que em março do ano passado eles planejaram produzir tudo que pudessem, faturar e não pagar ninguém”.
Ele cita como estranha a contratação da consultoria jurídica Wagner A. Alberto (WAA) para resolver alguns processos em aberto da empresa, tendo em vista a situação financeira difícil pela qual a Krause atravessava. Para ele, se não podiam nem pagar os salários, o comprometimento com mais um gasto se tornara suspeito. “Foi uma atitude baixa e mesquinha”, diz Leonardo. Ele se lembra dos funcionários sempre compreensivos com os atrasos de pagamento. “Eles não depositaram dez parcelas do meu fundo de garantia”, diz indignado. Todavia, entre todas, a sua situação não é a pior, há pessoas com vinte anos de Krause sem receber os direitos empregatícios. Leonardo confessa não acreditar ainda no golpe da família Krause. “Tudo bem falir, mas era só falar ‘vamos fechar, vender o prédio e pagar vocês’”.
Camila Peres, assistente de vendas há nove anos na empresa, tinha bastante contato com Walter durante o trabalho “Ele conversava, brincava, claro que tinha seus momentos de autoritarismo, mas não deixou transparecer nada de diferente”. A assistente sabia da situação crítica da metalúrgica, mas esperava ser notificada diante de uma decisão oficial. “Eles não devem conseguir colocar a cabeça no travesseiro de tanto remorso”, diz Camila. Agora, sua esperança é a justiça. “Estamos nas mãos do sindicato”.
O processo
Joseildo Queiroz, conhecido como Cica, é o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André que está à frente do caso. “Consegui contato com Walter uma vez, ele me disse para ligar para o seu advogado Wagner A. Alberto, da WAA, que cuidaria do caso”. Fiz isso, porém, o advogado me explicou a situação financeira de Walter e confirmou a recusa do pagamento dos direitos dos funcionários.
Cica conta da dificuldade em conseguir que a empresa, pelo menos, desse baixa nas carteiras de emprego. Feito isso, o Sindicato entrou com pedido de arresto dos bens dos Krauses, do qual o juiz concedeu, apenas, o imóvel da fábrica que garantirá o pagamento dos débitos da empresa com os trabalhadores. Em mais de quinze anos de carreira, essa é a primeira experiência de Cica em casos desse tipo.
Em 1º de abril foi o último dia para os empresários entrarem com alguma defesa, todavia, não se manifestaram. “É típico de patrão que se esconde”, comenta. Cica garante o emprenho do Sindicato para a resolução do caso. “O nosso papel é buscar os benefícios para o trabalhador e fiscalizar seus direitos”, completa.
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