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Os escândalos de corrupção envolvendo o presidente Michel Temer (PMDB) levaram uma onda de manifestante às ruas pelo “fora Temer”. Eles pedem a saída do chefe de Estado brasileiro e eleição direta para escolher o novo presidente do país. A Constituição não prevê o processo eleitoral popular nessa situação, mas juristas apontam dois caminhos legais para colocar nas mãos do povo os votos para presidente, via Proposta de Emenda Constitucional (PEC) e julgamento do TSE.
A Constituição em vigor no Brasil prevê no artigo 81 que deve existir eleição indireta, ocorrendo a vacância dos cargos de presidente e do vice-presidente nos dois últimos anos do mandato presidencial, explicou a professora de Direito da Universidade Católica do Salvador, Thaís Cavalcanti. “Se Michel Temer for impedido, o Congresso Nacional teria 30 dias para organizar uma eleição”, disse a jurista. Embora argumente que houve uma ruptura na relação do Estado com a população e que a legitimidade está abalada, Thaís acredita que seguir a Constituição seria o melhor para o país no momento.
“Quando escutamos ‘eleição indireta’ lembramos da ditadura. Mas dois anos é pouco tempo para que haja toda a mobilização de eleição direta. Na minha opinião, seria menos desgastante para o Brasil seguir a regra que há, até as próximas eleições diretas, em 2018”, disse Thaís. O professor de Direito da FGV, Michael Mohallem, também apontou o timing como um obstáculo para fazer alterações na Constituição. A PEC aprovada mais rápido na história do país levou quatro meses, disse ele. Considerando a instabilidade política e possível falta de consenso entre parlamentares, bater esse tempo é improvável.
Na última quarta-feira (31), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou a PEC 67, do senador José Reguffe, que prevê eleições diretas no caso de vacância dos cargos de presidente e vice nos três primeiros anos do mandato presidencial. O texto ainda precisa ser aprovado no Senado e na Câmara. O deputado Miro Teixeira protocolou a PEC 227, pautada para terça-feira (6) na CCJ da Câmara. Essa última prevê eleição direta no caso de vacância dos chefes de Estado até os últimos seis meses de mandato.
Pingue-pongue da PEC
O trâmite para a aprovação de uma PEC é como um “pingue-pongue”, considerou o professor de Direito da Universidade Mackenzie Campinas, Fernando Tadeu Marques, e explicou: ao ser apresentada, a PEC é analisada pela CCJ. Se aprovada, a Câmara cria uma comissão especial para analisar o conteúdo com um prazo de 40 sessões do Plenário para dar um parecer. Depois, a PEC é votada pelo Plenário em dois turnos, com intervalo de cinco sessões entre uma e outra votação. A proposta precisa de 3/5 dos votos em cada turno.
Aprovada, a PEC segue para o Senado, é analisada pela CCJ e depois pelo Plenário, onde precisa ser votada em dois turnos, explicou Marques. “Se o Senado aprovar o texto como recebeu da Câmara, a emenda é promulgada pelas Mesas da Câmara e do Senado. Se o texto for alterado, volta para ser votado novamente na Câmara. A proposta vai de uma Casa para outra até que o mesmo texto seja aprovado pelas duas”, disse o jurista.
Julgamento do TSE
O caminho mais plausível, na opinião de Mohallem, seria via decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a questão de cassação de chapa, que prevê eleições diretas até os últimos seis meses de mandato. Mohallem afirmou que a determinação do Código Eleitoral é mais específica em relação à atual situação política do país do que a Constituição e que, portanto, a lei especifica vale sobre a geral.
“Se o motivo da eventual cassação ocorrer pelo julgamento do TSE das diversas ações que acusam a chapa vencedora (Dilma/Temer) nas eleições de 2014 por abuso político e econômico, podemos ter eleição direta”, acrescentou Marques. Na Constituição, segundo Mohallem, há uma interpretação de vacância mais relacionada à morte, enquanto a lei da mini-reforma eleitoral, aprovada em setembro de 2015, refere especificamente a casos de cassação e impeachment.
Novo presidente
Depois da decisão sobre eleições diretas ou indiretas, caso Michel Temer deixe a presidência, Mohallem levantou outra questão importante que precisará ser discutida: as regras para o novo candidato. “A lei eleitoral no Brasil exige filiação a partido político por no mínimo seis meses, saída de cargo público para alguns casos, ter mais de 35 anos (…)”, exemplificou Mohallem. O requisito de filiação partidária, no caso de uma eleição não esperada, exclui uma série de nomes da lista de candidatos, de acordo com o jurista.
Se a lei não for flexibilizada, o novo presidente deverá ser algum congressista, que já transita no mundo da política, disse Mohallem. O aparecimento de outsiders é provável caso o TSE permita exceções às regras. Thais afirmou que momentos de ruptura como o que o Brasil está vivendo marcaram mudanças constitucionais e de leis importantes no passado, mas reforçou que todas as decisões devem ser feitas com vista na situação frágil da política e da economia do país como um todo.